quarta-feira, maio 28, 2008

A propósito do dia dos vizinhos fui recuperar este texto escrito no meu primeiro blog ainda no Sapo...


Quarta-feira, 4 de Fevereiro de 2004

Celas de isolamento

Durante mais de 20 anos vivi no Alentejo...nos últimos anos num monte alentejano onde acordava com os pássaros que escolheram umas das árvores junto à janela do meu quarto, para sua morada habitual.
Eram bonitos, pretos e vermelhos...mas nunca soube que pássaros eram...nem isso me pareceu importante.
Era revigorante levantar-me abrir a porta e olhar ao longe...ver terras de Espanha do outro lado do rio...ouvir o silêncio apenas interrompido pelo ladrar de um cão...ou o chilrear dos pássaros.
Um dia um amigo que passou o fim de semana connosco e que reside habitualmente nos Açores muito perto do mar...disse-me algo que me fez impressão:
-Esta noite não consegui dormir por causa do silêncio.
Explicou então que em casa adormece com o som do mar em fundo e que o silêncio que encontrou no Alentejo...era algo que o impedia de dormir.
Estranho? Talvez mas compreensível.
Depois de 20 anos no campo, vejo-me de repente num prédio de 9 andares, vivendo no 8º tendo que andar de elevador para cima e para baixo...encontrando pessoas que nem sei em que andar e porta vivem...e o que mais me chocou foi o episódio que aconteceu comigo um dia logo pela manhã.
Abro a porta ao mesmo tempo que um dos meus vizinhos de andar (éramos quatro)...e qual não é o meu espanto quando vejo essa pessoa...recuar e fechar a porta rapidamente só para não ter que descer comigo no elevador.
Já tinha reparado que era uma pessoa que nunca dizia bom dia nem boa tarde...que um dia chegámos ao mesmo tempo e ela não quis subir connosco, mas na altura não liguei...quando a vejo fechar a porta como se fosse um bicho do mato só para não partilhar comigo o elevador...fiquei a pensar que aqueles caixotes não são casas...são celas de isolamento.
Se já antes tinha a certeza que queria sair dali...nesse dia tomei a firme resolução de o fazer o mais depressa possível.
Felizmente que consegui. Hoje não tenho elevadores, tenho vizinhos mas são vizinhos que vivem na mesma rua e que me dizem bom dia com a maior das naturalidades.
Tenho pena que as pessoas não consigam continuar a ser "gente"...mesmo quando vivem em caixotes de betão frios e impessoais.

4 comments:

Elvascidade disse...

Bem dita terrinha minha!

Pitanga Doce disse...

Ah minha querida, eu já vi este filme. Uma vez, aí no interior das Beiras, uma pessoa me disse: "Este silêncio me incomoda".
O quÊÊ? Preferes o barulho insuportável da cidade?

Fiquei pior que estragada. Gosto das manhãs que são "minhas" e que ninguém as interrompa com rádios altos, sirene de ambulâncias e de polícia. Gosto de ver a minha Serra quando abro a janela e a deliciosa paz que ela transmite.

Já deu para perceber que não estou vivendo no lugar certo. hehe

beijos matutinos (não! Vespertinos)Ah, este fuso horário!

fj disse...

Bem como fiz um comments extensissimo no post anterior e como tal tb acenta bem neste.
Agora as pessoas ja não sabem ou nao querem cultivar as amizades de pessoas q acabam de conhecer e q na maioria das x serão os seus vizinhos pelos proximos e longos anos.
Enfim...
manias desta sociedade actual q aos poucos parece ir apodrecendo:(
bjinhos amiguinha

Li disse...

É engraçado como em prédios se vive tão mais perto fisicamente uns dos outros e, no fundo, tão mais longe...
Eu enquanto estudei vivi em apartamentos e não conheci grande parte dos nossos vizinhos, mas nunca tive nenhum que se recusasse dizer-me bom dia ou ir comigo nas escadas ou elevador...isso já é ser antipático e anti-social...

Bjitos

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